domingo, 21 de fevereiro de 2010

Aventuras que inspiram


Acabo de ler um texto que me deixou boquiaberta. Uma amiga me “apresentou” “A grande aventura” da jornalista Eliane Brum e fiquei emocionada com o que li. Há tempos não leio algo tão simples e encantador. De início, ainda na linha fina, a frase “amar é mais arriscado que desbravar a natureza selvagem” causou-me uma perturbação.

A inspiração dela foi o filme “Up – Altas aventuras”, uma animação da Pixar, muito elogiada. É a história de um velhinho ranzinza que sai voando com a casa suspensa por balões para fugir da ida para um asilo...

A minha é... Bem, parei para pensar o que justifica a nossa vida. Você ama alguém? Já se aventurou alguma vez explorar o mundo em busca de algo que deseja intensamente?

São perguntas tão tolas, mas que se pararmos para pensar, só vamos nos dar conta disso quando chegarmos a velhice. É sério! Ou você nunca se pegou pensando na época boa que você era criança e que não soube dar valor? A gente tende a fantasiar, de maneira quase exagerada, a nossa infância. E aí a gente vai sempre querer fazer alguma expedição na vida que valha a pena. Mas a Eliane me alertou que “não há aventura maior – e mais arriscada – que a vida compartilhada com quem se ama”.

A gente só vai perceber o quanto uma pessoa é importante para nós quando a perdemos. Seja por qual for o motivo. Como costumamos ser covardes e desistimos antes mesmo de tentar conquistar o que queremos, pergunto: existe algum limite para olhar a vida com generosidade e querer compartilhar com alguém as alergias e tristezas do caminhar?

A jornalista diz que “não há vida que não tenha sua cota de desistências, perdas e covardias”. Sejamos pobres ou ricos, bonitos ou feios (claro que isso é muito relativo), somos semelhantes e  “nossas semelhanças são avassaladoras”. Quantas vezes não quisemos nos reconciliar com alguém e sequer tivemos coragem de ligar para dizer o que sentimos? Costumamos transformar nossos obstáculos em verdadeiros campos de batalha, digo: você com você mesmo. E quando estamos lutando, perdemos a graça de viver uma aventura que pode nos levar a inúmeras descobertas.

Daí, esperamos que venha alguém de fora e nos ajude a olhar a nossa própria vida. E a gente tenta fazer um esforço para se manter no presente, mas se prende nos guardados do coração. A gente começa a se lembrar de como o passado foi. Coisas boas ou ruins. Mas será que vale a pena apostar na caixa de memória? Eliane, diz que fez o exercício de se lembrar das “coisas mais chatas” e supostamente banais e me fez a pergunta: “Do que você se lembra, o que guardou por todos esses anos”? Eu repasso a você.

Sem dúvida lembro-me do amor dos meus pais por mim nas noites de páscoa e natal em que ficava caindo de sono a espera do coelhinho ou do papai Noel trazer os meus presentes, contudo antes das 22h acabava dormindo. Somente no outro dia ouvia os meus pais dizer: “Você não ouviu, ele passou por aqui e deixou esses presentes para você!”

Hoje, fantasio a casa dos meus pais, daquela época, e não suporto mais nenhuma dessas datas... Ainda não sei por quê... Talvez, porque eu não possa voltar no tempo e dar muito mais valor ao que já adorava, mas que sempre reclamava que queria algo mais... Eu sempre considerava os meus presentes os melhores que já tinha ganhado, mas queria mais. Todo ano a espera aumentava... mas daí você cresce e descobre que tudo não passou de uma simples ilusão de conto de fada. Decepção? O motivo cada um tem o seu.

Mas chega uma idade que você quer viver um outro conto de fadas. Aquele que você pode querer ouvir: “e viveram felizes para sempre”. Na certa você vai querer contemplar o mais belo amanhecer e entardecer do dia. Daí você vai desejar a casa mais bonita e mais iluminada. E vai querer ver somente as coisas boas da vida sem nenhuma inveja no olhar. Vai considerar que são as pessoas mais belas do mundo. Porque vivem felizes.

Mas quando se dar por si, descobre que essa pode ser a maior de todas as suas aventuras. “O amor é sempre território não desbravado”. A escolha por alguém, ou deixar que alguém nos escolha, pode parecer uma experiência arriscada. Até por que quando nos entregamos, e a pessoa passa a conhecer nossas limitações e capacidades, é um grande risco. E como afirma Eliane, “damos ao outro um grande poder, o poder de nos refletir”.

Parei para lembrar de quem um dia me amou intensamente. E como já deve ter acontecido com você, só foi se dar conta da importância dessa pessoa muito depois. Hoje, afirmo que, sem dúvida, vale a pena amar quem tem o poder de nos refletir no olhar. Aquelas pessoas que nos fazem se sentir melhor do que somos. Aquelas que vêem aquilo que podemos ser. Mesmo que enxerguem nossas imperfeições, mostram-nos que somos capazes de ir muito além. Porque o desejo contagia e nos torna capazes de acreditar que amar é maravilhoso.

Sou mulher e já tive um homem que me via como a mais bela do mundo. Além disso, todas as manhãs me acordava dizendo declarações de amor que nunca se repetiam, sempre se renovavam. Quando ele olhava nos meus olhos eu via tudo de bom e lindo. Não sei se você já teve esse presente. Mas eu tive, e por minha ganância individualista deixei-o ir em busca de alguém que o desse o valor que eu não podia dar. Sempre pensava que era demais para mim.

Hoje, vivo a espera desse olhar. Um amor generoso capaz de refletir a gratidão de ter alguém ao lado. Talvez você, assim como eu, espere reencontrar ou encontrar alguém “com a capacidade que só o amor generoso tem de nos tornar mais radicalmente o que somos”. Mesmo que a vida exija muito.

Ah, acredite, como diria Veríssimo, não existe pessoa certa. Afinal, também nunca entendi o conceito de “pessoa certa”. Sempre acreditei que quem me amar de verdade vai me fazer bem. Assim, como espero olhar esse outro e o torná-lo melhor.  

Não quero alguém parecido comigo. Quero alguém que me enxergue, me escute e me compreenda. Que tenha um olhar amoroso e generoso. Mesmo que não saiba, mas que quando eu olhe nos olhos dele eu consiga refletir o que posso construir de bom para nós.

Já cresci o bastante para saber que os contos de fada não existem como nos livros. Mas não preciso deixar de procurar alguém para amar só porque não acredito mais em coelhinho da páscoa ou papai Noel. Sei que príncipe encantado não vem ao meu encontro montado em um cavalo branco. Mas sei que posso tentar partir em busca de um olhar que contemple o mais pródigo afeto.

Quero me descobrir amada e compartilhar dessa generosidade. Não invejo a Eliane, mas também quero passar no supermercado e comprar todas as coisas boas que ele goste de comer. Com os olhos de amor ficarei satisfeita se ele estiver trabalhando na gravação de um programa de TV, assim como fez a repórter. É claro que como jornalista ficaria eternamente feliz se encontrasse alguém que pudesse ser, também, o meu parceiro de profissão. Pode ser o meu sonho, mas o que me importa mesmo é encontrar alguém que eu ame de verdade a ponto de ligar na madrugada só para dizer “eu te amo”. É isso mesmo, algo bem banal. Pode ser bobo, brega?

Sim, pode. Mas hoje, vou voltar para casa e o meu apartamento, que tem balões, não vai voar.

Um comentário:

Unknown disse...

Linda crônica, adorei!