segunda-feira, 26 de abril de 2010

Liberdade sobre duas rodas

Dia desses conversava com um colega que é apaixonado por moto... 
O papo me fez lembrar algo que vivi durante algum tempo... 
Quando tudo acabou escrevi este texto que reflete as paixões e as angústias de uma vida sobre duas rodas

Sabe o que é sentir o vento contra o seu corpo permitindo a sensação de flutuar? Algo como ganhar asas a liberdade sem um destino certo, só com a adrenalina correndo nas veias... Tudo isso em cima de duas rodas...

A emoção é se sentir livre em um momento que te faz viajar e te leva a um mundo imaginário. Seus pensamentos voam solto ao vento. Em cada curva é preciso equilíbrio entre sonho e realidade, para que assim continue firme no seu caminho. Nas estradas há muitos obstáculos, mas com a permissão de um Ser Superior você pode ir muito além do que imagina.

Andar de moto é assim.  “Você só começa a tremer quando se chega em casa”, um amigo sempre me diz isso. E aí, você olha para o rosto do seu amigo e somente num olhar mantém a cumplicidade de um segredo que ficará guardado só entre vocês. É a travessura mais gostosa que dois jovens podem fazer. Algo tão inocente e ao mesmo tempo tão sonhado e tão premeditado.

Para muitos somos loucos. E não costumam compreender essa paixão por velocidade. Eu diria que adoramos nos aventurar para desbravar as belezas dessa natureza tão exuberante. Talvez seja uma das formas mais puras de entrar em contato com a Força que move todo esse nosso Universo. Sinceramente, ainda não sei como explicar em palavras.

O que posso lhe contar é que somos dois jovens que não usam jaquetas pretas de couro, mas que adoram sair com um destino incerto. Quando nos perguntam: “para onde vocês vão?”, a única resposta que nos vem à mente é: “por aí...”. É verdade, é por aí que vivemos as situações mais inusitadas.

Meu amigo é um jovem experiente piloto e eu sou... Bom, o pouco que entendo de moto é só na teoria. Apenas aproveitamos nossas afinidade e a paixão pelo motociclismo em algo mais do que um gosto em comum. Não temos regras, mas o respeito e a confiança entre nós são mútuos. Ah, apesar de ele ser irresistível como dizem minhas amigas, não somos e nunca fomos namorados, muito menos ficamos. O único pretexto que nos reúne é a paixão por motos.


Ser descontraído é um dos principais requisitos para se conquistar e garantir a nossa companhia. Se você é piloto deve saber a vontade insana de superar fronteiras, e logo depois parar em um ponto qualquer que te possibilite uma vista sem igual. Daquelas que você contempla o nascer ou o pôr-do-sol no seu mais puro momento.


Hoje andamos numa Honda CB 500. Mas o começo foi bem simples. De uma Dream c100, passando por uma CG 125 e uma CB 250. Ah, também é bom lembrar dos tempos da velha off-road Yamaha, uma moto de trilha que o meu parceiro tinha.

Quantas vezes o acompanhei em algumas expedições malucas pelo meio do mato, é claro que eu não ia na garupa de uma moto de trilha, o que fazia era dar suporte para qualquer eventualidade. E ao final, ele sempre chegava com aquela cara toda suja de terra, soltava um berro e vinha correndo para cima de mim me pegando no colo, dizendo: “lindinha, você viu o que eu fiz...?”...

Tudo bem que até já demos uma voltinha numa CBR 1100. Lembro que quando o ponteiro avançou os 200km/h, minha reação foi fechar os olhos e sonhar que estava voando. O risco de uma queda era, digamos, 99%. Não vou dizer quando ou onde isso aconteceu, se um dia minha mãe ler isso, nem sei o que ela vai dizer... Ou talvez, nem diga nada, porque ela sabe o quanto gosto de me sentir livre. Mas confesso que avançar a mais de 200 km/h numa pista lisa, deslizar em uma curva e sair ileso é algo para poucos.

O que importa para nós é alegria de estarmos livres para curtir belos momentos. Vejo o meu amigo como uma criança que não larga o brinquedo e que também não abre mão de um amiguinho para brincar. Nesse caso, uma amiguinha. Sim, brincamos. Já não somos mais crianças, mas não perdemos a essência de uma boa dose de traquinagens que resultam em gostosas, altas e sarcásticas gargalhadas.




Impressiona como essa máquina tem traços perfeitos. E fico intrigada porque ficamos em êxtase quando ouvimos o ronco dos motores. É um misto de admiração e espanto que causa estranheza. Às vezes a gente se pergunta: de onde vem essa paixão de querer sair de moto sempre que podemos? Não sei.


Lembro-me quantas vezes ao sair da escola meu amigo estava lá me esperando. Só dava tempo de ligar para os meus pais e avisar: vou me atrasar para o almoço. De surpresa a gente saia para passear pela beira mar até as falésias. Depois, mortos de fome, voltávamos para casa com as caras mais sapecas. Era algo tão simples, mas tão fabuloso.

Éramos literalmente livres. O vento no rosto, o contato à natureza, os caminhos incertos eram uma forma de lazer inconfundível que nos liberava de todo e qualquer estresse cotidiano. Que fosse uma voltinha de 10 minutos, mas era o tempo suficiente para recarregarmos as baterias. E tinha que ser só entre nós dois. Se andássemos com outra pessoa, quando nos encontrávamos sabíamos que a nossa sintonia era única. Não se comparava a nada e nem a ninguém.

Dizíamos que o nosso limite era o horizonte. Tínhamos um sonho de fazer uma longa viagem pelo Brasil. Mas essa história foi obrigada a ter um fim. Nossa união quase mística sobre duas rodas teve de ser aprisionada e lançada para bem longe.

Meu amigo descobriu que vai ser pai. Sua namorada o proibiu de me ver ou falar comigo. Eu vou me casar. Meu noivo não gosta de moto muito menos suporta algum tipo de aventura. Nem sei quando terei vontade de voltar a andar de moto.

Quem sabe eu desista dessa idéia estapafúrdia de querer casar, compre uma moto, aprenda a pilotar de verdade e saia pelo mundo sem destino e sem hora para voltar. 

Será que terei coragem?

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